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Mostrando postagens de outubro, 2015

Perdido em Marte (filme de 2015)

Já tinha visto uma resenha sobre o livro de Andy Weir antes de ir ao cinema; assim, já contava com o tom hilário que domina boa parte da narrativa. E, ao final das contas, o discurso e as atitudes debochadas do protagonista são o ponto mais interessante do filme, por apresentarem um novo olhar sobre uma jornada espacial. Por ser uma produção hollywoodiana acerca de uma viagem interplanetária, não poderiam faltar os clichês: sala da Nasa, telefonemas ao presidente dos EUA, várias e várias cenas da equipe na Terra batendo palmas cada vez que algo dá certo com o personagem em Marte. Apesar dos bons efeitos especiais, são tantos os malabarismos que ocorrem no espaço que a verossimilhança da obra fica por um fio. No entanto, por ter um discurso mais humorístico que científico, sua validade não fica comprometida. Vale a pipoca e a jornada.

Sete faces do sobrenatural

Inspirada pelas resenhas do mês do horror do canal literário Tiny Little Things, decidi me dedicar à leitura de contos com essa temática. No entanto, por não estar habituada ao assunto, resolvi começar por algo menos assustador, como a coletânea adolescente organizada por Marcia Kupstas. Composto de 6 contos, o livro é metade bom, metade ruim. Três histórias são interessantes e quatro delas são bastante forçadas, com diálogos inverossímeis e situações que geram muito mais o sentimento de vergonha alheia que o de medo. Os dois contos que iniciam a coletânea são os mais interessantes. "Quando só resta o demônio", de Orlando de Miranda, traz uma crítica social forte, que revela medos muito mais relacionados à violência cotidiana do que à presença do sobrenatural. "A caixa da vingança", de Marcia Kupstas, traz um ótimo desfecho para uma história de suspense que prende a atenção. Não tão bom quanto os dois primeiros, mas ainda digno de menção honrosa pela trama

Turma da Mata - Muralha (Fujita/Cruz/Calil)

Um dos enredos mais adultos da coleção de Graphic Novels da Turma da Mônica, o livro conta, em poucas páginas, uma batalha com um quê de épico. Na trama, os personagens apresentam vidas marcadas por algum trauma, o que garante complexidade às figuras. Jotalhão, por exemplo, é um filho de guerreiro que não acredita no seu potencial e acaba preso em um serviço administrativo inútil, ao invés de usar sua força para defender a floresta. A HQ ainda toca em temas ambientais, mas sempre com um viés mais complexo do que aquele apresentado nas narrativas tradicionais de Mauricio de Sousa. Como o objetivo é contar uma história de guerra, o leitor se depara com situações mais delicadas, em que os personagens agem de modo mais maduro - e, por vezes, ambíguo. Histórias com cenas de luta não são o meu forte, mas não dá para negar o valor da recriação literária feita. Vale a leitura, principalmente para quem gosta do gênero.

Gato pra cá, rato pra lá (Sylvia Orthof)

Iniciado com uma menção de Carlos Drummond de Andrade, que elogia a obra, o livro infantil parece prometer muito. No entanto, ainda que tenha ilustrações bonitas e uma história interessante, não é memorável. Trata-se de um enredo simples, em que o gato deixa de perseguir o rato em nome do amor, da paz mundial etc. e tal (ou algo do gênero). Razoável, mas não excelente.

A briga da porta com a parede (Antônio Hohlfeldt)

Apesar de ser um livro para crianças bem pequenas, ele trata, de maneira quase subliminar, a delicada questão da violência no ambiente doméstico. O autor traça o cenário de uma casa maluca, em que todos os elementos estão em constante pé de guerra, com insultos e ofensas proferidos a quatro ventos. Ao final, mostra que mesmo os cômodos da casa aparentemente esquecidos, sem força (representação simbólica da criança) têm como reverter essa situação para criar um cenário de paz.

Quando tudo começou (Bruna Vieira e Lu Caffaggi)

Apesar de ser rotulado livro de quadrinhos, trata-se mais de uma história muito bem ilustrada (por Lu Caffagi, excelente artista da área). Para quem não conhece muito das publicações de Bruna Vieira, famosa blogueira adolescente, o livro desperta pouco interesse. Seu maior atrativo são os desenhos que acompanham a história - que é bem fraquinha.

Mauricio de Sousa - Primeiras histórias

A edição com os primeiros gibis da Turma da Mônica é um trabalho esperado há anos pelos fãs e colecionadores, uma vez que nem o próprio Mauricio de Sousa tinha todos os números de suas primeiras histórias publicadas. O resultado é muito interessante, principalmente para uma análise do contexto histórico. Em uma história, por exemplo, Franjinha quer hipnotizar um ser inferior intelectualmente e lembra-se que o pai chamou a esposa de "burra", o que leva o garoto a procurá-la - um exemplo clássico do machismo descarado dos anos 60. O tom nonsense das tirinhas também é muito curioso - como em uma das narrativas em que, para fazer o Bidu crescer, Franjinha o submete ao mesmo processo de fabricação de um bolo, jogando-lhe fermento, batendo a "massa" e, por fim, colocando o cãozinho dentro do forno. Bastante politicamente incorreto para os tempos de hoje, os primeiros gibis têm seu valor pelo valor de curiosidade histórico agregado em uma edição

Caçando carneiros (Haruki Murakami)

Com um pouco do toque melancólico de Norwegian Wood e cenas oníricas, tais como em 1Q84, este livro de Murakami tem elementos que prendem a atenção do leitor. Mistura de vários gêneros e modos de contar uma história, o autor se vale um pouco do suspense das narrativas de detetive para fisgar o seu público. Não é por um simples acaso que o seu protagonista (sem nome) está sempre lendo um livro de Sherlock Holmes ao longo da trama. No entanto, ao contrário dos enredos clássicos de suspense, nesta obra a resolução dos fatos chega a ser um pouco frustrante. Por tudo ocorrer no plano do fantástico/onírico/espiritual, qualquer desfecho seria, em princípio, aceitável. O escritor, por seu domínio da arte da escrita, consegue manter a verossimilhança no livro - mas, ainda assim, não fiquei totalmente satisfeita com o encerramento da trama. Personagens importantes da história são descartados por Murakami quando não funcionam mais na vida do protagonista. Ainda que este seja um ser r

Deus branco (filme de 2014)

É um excelente filme sobre o melhor amigo do homem - e sem o toque infantil de um Beethoven ou de uma Lassie. Pelo contrário, é uma obra densa em críticas à nossa sociedade, na qual acaba havendo uma rebelião de cães muito semelhante à que ocorre em o Planeta dos Macacos. No entanto, ao contrário do clássico hollywoodiano, a revolta canina é extremamente verossímil e parece bastante possível de ocorrer a qualquer hora. Talvez essa impressão venha da direção excelente, que torna o protagonista cachorro muito instigante. A sua atuação (Hagen, no filme) foi realizada por dois cães (um para cada fase da vida do personagem), que ganharam até uma espécie de Oscar animal. Apesar do viés mais adulto, não é um filme proibido a crianças um tanto maiores - pode ser um forte incentivo a repensar como tratamos os animais. O longa aborda questões como abandono, violência, centros de zoonoses... e até mesmo o tema do vegetarianismo, de maneira implícita.  O ritmo mais parado, no in

A mordida da manga (Mariatu Kamara)

Este é o sétimo livro do meu desafio literário "Escritoras do mundo", no qual me propus a ler 1 autora de cada um dos países, a fim de tornar minha estante mais rica em culturas e, principalmente, menos machista. Assim como em "Americanah" (da nigeriana Chimamanda Adichie), "Precisamos de novos nomes" (da zimbabuense NoViolet Bulawayo) e "A primeira luz da manhã" (da indiana Thrity Umrigar), este é um livro sobre a imigração e a adaptação (ou não) a países desenvolvidos, que, em princípio, podem oferecer tudo a vítimas da guerra e da fome. No entanto, assim como nos 3 livros lidos anteriormente, a autora de "A mordida da manga" vem nos mostrar que a realidade não é tão reconfortante assim para os que buscam refúgio. (Um parênteses sobre a dificuldade que tenho para encontrar escritoras de diferentes nacionalidades em meio a um cânone já solidificado em torno dos homens. Por mais que sejam livros excelentes todos os citados, não

Azul é a cor mais quente (Julie Maroh)

Apesar de ainda não ter assistido ao filme, dizem que a graphic novel é muito melhor (e a própria autora afirmou não ter gostado muito da adaptação de sua história para as telonas). No entanto, ainda que isto dê a entender que estamos diante de uma obra de arte quando decidimos ler Azul , não é bem assim. Os pontos fortes da trama são o seu pioneirismo e a delicadeza com que a descoberta da própria homossexualidade é retratada. A autora mostra todos os conflitos advindos da afirmação desse modo de amar e a rejeição pela sociedade. Graficamente, o modo como a cor azul foi inserida é muito interessante, ainda que o traço da desenhista não me agrade. O que me incomodou um pouco na história foi o caráter falho das personagens - ainda que isso dê um tom muito realista à trama e fuja dos estereótipos românticos. Há atitudes de ambas as protagonistas que as tornaram muito fracas, criticáveis - como elas se rendem a traições, deslealdades, atos falhos... Tudo somado, dá a entende

O sofá laranja (Fania Szydlow Benchimol)

Livro para ser lido de uma sentada só, bem curtinho, "O sofá laranja" é uma história tocante de perdas e solidão. Ainda assim, a obra se vale de alguns recursos forçados, como o mote inicial, de que a autora encontrou algumas cartas sobre um banco do Central Park e decidiu publicá-las por conta própria. Novela epistolar, portanto, a trama gira em torno de cartas que uma esposa escreve a seu marido a pedido da filha. Elas funcionam como uma espécie de terapia, já que o esposo não mora mais na casa (por motivos que serão esclarecidos - ou não - somente ao final da história). Conforme relembra os momentos de convivência, a narradora vai desenterrando pequenas lembranças do cotidiano, que nos são apresentadas de forma bastante poética. Apesar de não ter apreciado muito a escolha do lugar em que se situa a narrativa (e nem da justificativa relacionada a ele), não tenho muitas ressalvas em relação à obra. Vale ser lida de uma sentada só em um bom sofá laranja.