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Mostrando postagens de novembro, 2015

Contato (filme de 1997)

O grande diferencial deste filme, pertencente ao gênero da ficção científica, é preocupar-se mais com o debate entre a fé e a razão do que mostrar seres sobrenaturais e explosões no espaço. Isso garante, se não profundidade, ao menos diálogos interessantes entre os personagens, cada um cego defensor de sua crença pessoal. Toda a trama é bem amarrada, e os maiores falhas do enredo são as concessões ao clichê: uma história de amor, um personagem marcado por um trauma de infância, a persistência da protagonista que a leva a alcançar seu sonho... enfim, nada de novo sobre a Terra. O final da obra também apela para uma solução um tanto forçada, ainda que inovadora. Em suma, vale a pena, mas não é sensacional.

Viajo logo Existo no velho continente

O livro traz mais informações do que o primeiro volume, sobre a América Latina. Há mais textos do casal que viaja o mundo sobre sua estadia na Europa - os pontos turísticos, os passeios fora da rota tradicional, o que vale ou não a pena fazer. É uma obra simples, mas que atende a seu propósito.

Retrato do artista quando jovem (James Joyce)

Eu gosto de personagens de bom e de mau caráter - sou tão fisgada pela leitura de um atormentado Raskolnikov quanto pela de um sonhador Dom Quixote. No entanto, não me apresentem arquétipos daquele que está perdido na vida, em fuga sem saber para onde, rebelde sem causa. Não tenho paciência com Holden Caulfield e similares. Em "Retrato de um artista quando jovem", somo introduzidos em uma história de vida desde o seu começo até a juventude - em suma, um romance de formação. O modo de narrar acompanha a maturidade de Stephen Dedalus, protagonista, o que torna as páginas da infância um tanto confusas, assim como o falar de um garotinho. Ao longo da narrativa, o fluxo de consciência não é propriamente difícil de acompanhar - só é chato. O protagonista nunca sabe o que quer, e lemos páginas e páginas sobre quais as suas prioridades atuais na vida (que serão mudadas na semana seguinte). Um trecho do livro, especialmente entendiante, é quando o personagem decide se entregar com

Time dos sonhos (Luis Fernando Verissimo)

Para quem não entende nada de futebol, como eu, o livro é um lance perdido, um chute no escuro, um 7 a 1 para a Alemanha. Mesmo para quem entende de futebol, mas não o da época de Pelé e Garrincha, a obra pode ser um pouco menos palatável. As últimas crônicas, que são mais cotidianas, sem tantos nomes e referências técnicas ao esporte, são mais interessantes. De resto, é uma obra atrativa para quem é fã de futebol ou para atrair alunos que o sejam para o campo da literatura.

Louco - Fuga (Rogério Coelho)

Sou apaixonada por Turma da Mônica, obcecada pelas releituras lindas da Graphic MSP e, a partir de agora, fã de carteirinha de Rogério Coelho. Ainda que o Louco não fosse um dos meus personagens preferidos; mesmo que não fosse devoradora de quadrinhos... é muito difícil não se render a um trabalho tão bem-acabado, tanto na estética quanto no que se refere ao conteúdo. A HQ/graphic novel de Coelho é, para além de seu enredo principal (apesar de ser uma história sem limites definidos entre os planos narrativos), uma homenagem incrível a tudo o que Mauricio de Sousa e os incontáveis artistas de seu estúdio fizeram de belo e tocante. O traço do desenho é tão caprichado que cada página parece um quadro... Enfim, é louco. Loucamente belo e intenso como a loucura. Afinal, não há lógica que dê conta de uma coisa tão linda.

As mentiras que as mulheres contam (LFV)

Autor que escreve muito (apesar de praticamente só produzir textos curtos), Luis Fernando Verissimo tem uma produção desigual. Neste "As mentiras que as mulheres contam" há histórias de rolar de rir, algumas simpáticas, outras estranhas e umas sem pé nem cabeça. Por ser uma coletânea, o trabalho de seleção das crônicas poderia ter sido um pouco mais esmerado. (Em época de defesa - justa - dos direitos femininos, vale lembrar que houve uma edição anterior sobre as mentiras que os homens contam. Assim, o que o autor mais quer é tirar sarro da nossa convivência cotidiana, entre verdades e mentiras).

Pílulas azuis (Frederik Peeters)

Se todo livro já é, em princípio, uma batalha contra a ignorância, "Pílulas azuis" é uma guerra vencida em justa causa. Frederik Peeters, ao narrar uma experiência extremamente pessoal e autobiográfica, nos revela como ele (assim como eu) não sabia nada sobre Aids. Aids não tem cura, passa pelo sangue e pelo contato sexual. Se você ama alguém com o vírus, está condenado à camisinha eterna. Não poderá ter filhos. - Quem acredita nessas frases deve imediatamente ler Pílulas azuis para descobrir o quão pouco sabemos sobre essa doença, tão cercada de preconceitos e estereótipos. O autor, ao se apaixonar por uma portadora do HIV, vai pesquisando sobre a doença e percebendo que seus limites são muito mais flexíveis do que se fala. É possível fazer tudo (ou quase) sem correr o risco de contrair o vírus ou de viver preso a uma cama. E é nessa jornada de descobertas que o autor nos leva, de forma científica e poética.

Malinche (Laura Esquivel)

A índia nahuatl Malinche é uma das figuras mais emblemáticas e polêmicas da América Latina: amante de Hernán Cortéz, é considerada por muitos a grande traidora de seu povo, por ajudar os conquistadores a travar relações com Montezuma. Por outro lado, trata-se da primeira mulher americana a exercer a tarefa da tradução diplomática, figura essencial na política e com participação forte no processo da Conquista. Laura Esquivel realiza um misto de pesquisa histórica e romance em seu livro, com uma mirada muito compreensiva para as atitudes de Malinche à época. A autora busca contextualizar a vida da indígena e como se deu seu envolvimento com os espanhóis, o que ameniza o aspecto negativo de suas atitudes. A edição da Suma, ricamente ilustrada com códices mexicanos, é de muito bom gosto. No geral, trata-se de um livro bom, ainda que nem sempre seja convincente (afinal, a história foi bastante romanceada). No mínimo, serve como curiosidade sobre um dos mitos históricos das Améri

Contos, mitos e lendas para crianças da América Latina

O livro é uma parceria entre várias editoras, de 5 países latinos, para compartilhar nossas lendas e mitos fundadores. Talvez por ser um produto feito a várias mãos, senti falta de uma marca identitária na publicação. Não parece haver muita coesão entre as histórias selecionadas - faltou uma temática melhor definida. Das histórias selecionadas, apenas a de El Dorado me marcou um pouco mais. Os demais mitos e contos não chamam muito a atenção do leitor.

O cão que guarda as estrelas (I e II - Takashi Murakami)

Ganhador de vários prêmios, inclusive o de "Livro para chorar", estes dois mangás (O Cão que guarda as estrelas/O outro cão que guarda as estrelas) são complementares e contam histórias de vida difíceis, transformadas pela presença de um cãozinho. A narrativa principal, que perpassa ambos os volumes, é a de um homem extremamente solitário, que aos poucos percebe que sua única boa companhia é a do cachorro Happy (responsável por trazer o mínimo de alegria a uma pessoa totalmente desiludida). O modo delicado de abordar o tema da doença e da morte torna estes mangás um produto cultural muito bem acabado, indicadíssimo tanto para crianças quanto para adultos. Uma história profunda que merece ser lida.

Bruna, soroche y los tíos (Alicia Yánez Cossío)

Escrito alguns anos antes de "Cem anos de solidão", este livro traz elementos que nos encaminham a uma relação imediata com a famosa obra de Gabriel García Márquez: com vários elementos do realismo mágico, nos é contada a história de uma família, ao longo de diversas gerações, que representa a experiência universal. No entanto, aqui quem tem a voz de personagem principal é uma mulher, Bruna. E enquanto os homens de sua família são tomados por obsessões, incapazes de lidar com o cotidiano, as mulheres representam a força no meio da loucura, a resistência em uma sociedade patriarcal e dominada por preconceitos. Muitas das questões intrínsecas à cultura equatoriana são tratadas sem papas na língua: o preconceito contra o índio, o branqueamento forçado, a exploração dos mais fracos, a ostentação dos poucos ricos... Alicia Yánez faz críticas sociais incisivas ao contar a história da família de sua protagonista. Contudo, dominado por uma linguagem inovadora e poética, o

Banksy (Guerra e Spray)

Já conhecia muitos trabalhos de Banksy por meio de reproduções na internet, mas nunca tinha me dado conta de que, além da estética, seu modo de fazer arte é também revolucionário. O artista britânico tem um discurso coerente com as suas ações, e desconstrói discursos na prática, não apenas na teoria. Uma das ideias mais interessantes que o livro traz é a legitimidade de rabiscarmos qualquer parede em um mundo em que outdoors nos são impostos arbitrariamente, invadindo nosso dia a dia com incentivos a uma cultura essencialmente consumista. Se as grandes empresas podem exibir seus discursos em letras grandes pelas cidades, por que os grafiteiros não o poderiam também? Outro dos pontos fortes da obra são as cenas que mostram o artista, sorrateiramente, pendurando quadros de seus grafites em museus como o Louvre e o Metropolitan, como maneira de questionar a elitização da arte. Além de ser um livro excelente sobre arte, é um livro que desperta nossa reflexão sobre o mun

Bonsai (Alejandro Zambra)

O pequeno, quase minúsculo, livro do chileno Alejandro Zambra nos apresenta uma miniatura de duas vidas, um recorte da existência de dois personagens - que, tal como um bonsai, carrega em si todos os elementos da vivência, ainda que apresentados de forma tão reduzida. Não se deixe enganar pela pequena quantidade de texto, ainda mais considerando sua diagramação: encaixotado em pequenos blocos distribuídos pela obra. É um livro que traz, desde a sua pungente frase inicial, uma carga imensa de melancolia e desesperança. A relação dos protagonistas com a literatura e o diálogo proposto com outras obras torna o projeto de Zambra ainda mais interessante. O livro não tem de ser extenso, pois só das várias intertextualidades sugeridas é possível fazer diversas interpretações de seu significado. A obra diz muito por meio de pouco. O poder de síntese de Zambra foi somado à excelente diagramação da Cosac & Naify, que trouxe elementos pictóricos e de layout para potencializa

Transpatagônia - pumas não comem ciclistas (Guilherme Cavallari)

Este é um livro excelente sobre viagens, e conta com vários elementos que conduzem à sua beleza. O primeiro deles é o cenário incrível escolhido: com já 50 anos, contando apenas com a bicicleta e poucos equipamentos, o autor faz um roteiro pouco usual pela Patagônia, desbravando lugares pouco acessíveis e grandiosos. Principalmente o começo da obra, em que é narrado todo o planejamento da viagem, é tocante (até mais que o percurso em si, o que prova que uma viagem começa da decisão de fazer algo diferente). O autor lista, entre os motivos que lhe levaram a passar 6 meses longe de casa, a crise em que entrou após a morte da mãe e o choque de perceber o quando a vida passa rápido (tema também explorado no filme/livro "Livre", de Cheryl Strayed). As reflexões traçadas no pré-viagem vão desde a fugacidade do tempo até a nossa existência calcada no consumo (seja de bens, seja de ideais). Em seu trajeto, o autor pratica um sério exercício de desapego, restabelecendo o