O fato de ser o livro que inspirou Erico Verissimo a escrever o delicioso "Caminhos Cruzados" foi o que me levou a esta leitura. Mais conhecido pela distopia de "Admirável mundo novo" e por seu relato de uso da droga mescalina, Huxley, para mim, tinha aquela aura de autor descolado, questionador, irreverente e com uma linguagem tão clara e acessível quanto a do Verissimo-pai. No entanto, essas impressões seguiram pouco além das primeiras páginas de imersão na obra.
A quantidade de personagens é enorme, o que torna difícil para o leitor não só o acompanhamento do enredo, mas também os vínculos com essas figuras. É penoso sentir empatia - e não só em função da troca constante de cenários e atores na trama, mas também pelo fato de o livro, como um todo, ser o retrato de uma sociedade burguesa bastante elitista, quando não fútil e descartável.
Se a composição da trama já não é simples, esse efeito se intensifica com uma linguagem potente, mas por vezes mais filosófica que literária. Os personagens fazem longos discursos sobre o ser e estar no mundo, calcados em referências culturais diversas.
Não é um livro com o qual criei uma relação de afeto (pelo contrário, tratou-se de uma leitura bastante arrastada), mas é difícil negar seu valor literário. Não só foi vanguardista na técnica (múltiplos personagens, cortes cinematográficos), como também possui excertos maravilhosamente bem escritos.
Mais para o final, com a apresentação do caderno de rascunhos de um personagem, o enredo fica mais interessante - afinal, nas reflexões do personagem-escritor está o duplo do próprio Huxley, revestindo sua escrita de uma grande consciência metalinguística. Ademais, o desenrolar súbito e inesperado de alguns eventos prendem o leitor ao fim do livro. A diferença de ritmo entre as diferentes partes da obra é intencional - imita um movimento musical, tal como adianta o próprio título -, mas nem sempre é agradável ao leitor. Ainda assim, trata-se de uma boa leitura... e um bom contraponto.
Comentários
Postar um comentário