Uma experiência que me faz não tornar o cinema dispensável, por mais plataformas de streaming que haja, é a possibilidade de compartilhar emoções durante a exibição de uma obra. No caso de Capernaum, tive a oportunidade de participar de uma verdadeira sessão de catarse - que talvez só consiga comparar ao que foi assistir ao filme Dançando no escuro. No entanto, ao contrário da obra ficcional de Lars von Trier, este longa libanês é quase um documentário, de tão calcado que é na realidade - e, sendo assim, consegue machucar ainda mais.
A cena inicial, que já me fez chorar aos primeiros minutos da exibição, condensa muito do que se pode esperar dessa obra de arte magistral. Enquanto uma música de fundo incrível toca, vemos meninos libaneses brincando de guerra, com armas fabricadas com pedaços de madeira. Conforme a câmera se afasta e captura um plano maior, somos apresentados à imensidão da miséria e vemos o quão alegórica é a cena dos garotos pobres tentando mimetizar a violência que os cerca, todos os dias.
É a esse jogo entre o próximo e o distante, a metáfora e a realidade, a beleza plástica da cena e a desromantização da miséria que o olhar sensível da diretora Nadine Labaki nos convida. As críticas fáceis de que a obra faz pornografia da miséria não funcionam aqui. O retrato que a diretora faz é real, com uma vasta pesquisa de campo que escancara a realidade que não queremos ver. Filme necessário, doído, arrebatador. Uma experiência estética e ética da qual ninguém deveria se esquivar.
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