Minha visão do conflito israelense-palestino-árabe foi construída literariamente por meio da obra de Amós Oz, escritor de origem judia. O que nunca tinha me ocorrido até então é o quanto essa abordagem só dava conta de uma das narrativas possíveis para a região — e o pior, do ponto de vista de quem está ganhando.
Lina Meruane coloca muito claramente o seu lugar de fala nesta curta e potente obra: ela não é palestina. Nasceu no Chile, já com pouquíssimas ligações com a terra e a cultura que ficaram do outro lado do oceano. Entretanto, na sua tentativa de resgate da história familiar, a autora percebe que nada disso a impede de conhecer as cruezas do conflito que assola a região há décadas.
O primeiro relato da obra ("Tornar-se Palestina") contextualiza as reflexões que serão aprofundadas na segunda parte ("Tornar-nos outros"). É nesse aprofundamento que Meruane consegue fazer o leitor rever seus conceitos de paz e empatia, revelando a camada de atrocidades políticas que podem se esconder sob a placidez dessas e de outras palavras. "Tornar-nos outros" é quase que um texto de análise puramente linguística, em que a escritora mostra o poder bélico da linguagem — e a necessidade de estarmos conscientes desse uso e de mirarmos bem a quem direcionamos nossas falas.
Vulgarizado após a criação dos reality shows , o livro de George Orwell se tornou um daqueles clássicos que todos comentam e que ninguém leu. Qualquer um quer falar com propriedade do Grande Irmão, da sociedade vigiada, mas todos esses clichês não chegam perto do clima opressor que o autor impõe à sua narrativa. 1984 é uma obra provocativa e premonitória. Ainda que as ditaduras não tenham obtido o poder previsto pelo escritor (pois se travestiram de democracia), os cenários descritos são um retrato mordaz dos nossos tempos modernos. Um exemplo: para entreter a grande massa (os "proles"), o governo do Grande Irmão tem em seu poder máquinas que criam letras de músicas de amor aleatoriamente. Essas canções, desprovidas de essência humana, são entoadas pelo povo e logo se tornam o ritmo do momento. E assim se revela mais um dos inúmeros meios de controlar uma população que não pensa, não critica e não questiona. Quando foi escrito, 1984 era uma obra futurística. Lido h...
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