Enquanto a utopia é a etiqueta atribuída para catalogar os mundos sonhados, os panoramas ideais, a distopia age como seu contrário: igualmente possível em uma realidade distante, é marcada pelo signo do negativo, da falta, da opressão. Classificado como romance distópico, "O conto da aia" gera polêmicas - afinal, como a própria autora já afirmou em várias entrevistas, todo o enredo é inspirado em situações que já existem. Se distópico, seu livro tem ao menos um dos pés ancorado fortemente na realidade - e, justamente por isso, sua trama é tenebrosa.
Em um futuro próximo, as fêmeas se tornam inférteis em função do excesso de radioatividade. Nesse contexto de crise (tanto de população quanto da produtividade de alimentos), um estado autoritário assume o poder dos Estados Unidos, sob o pretexto de estar combatendo os terroristas. Depois deste golpe, todas as atrocidades são validadas, e passam a ser a lei, o bastião da moral segundo o texto bíblico. Mais do que um plot, a ideia do romance de Atwood é quase uma profecia, cada vez mais concreta em tempos sombrios.
A má interpretação da Bíblia que fundamenta o estado de exceção de Gilead é um dos reflexos mais claros no espelho entre realidade próxima e distopia. Basta para isso verificar que a primeira tradução da Bíblia em língua portuguesa sairá neste ano, de 2017 (apesar de toda a carolice secular de Portugal). Os textos sagrados não são discutidos nem aqui nem no romance - são restritos a um grupo de estudiosos, que pregam a fé cega, a crença sem provas... assim, de onde estamos para a sociedade retratada pela canadense, será um abismo realmente? Ou apenas um pequeno passo nos separa de um mundo de barbarismos?
A escrita de Atwood é contundente, bem elaborada, com frases complexas que exigem, por vezes, mais de uma releitura. No entanto, como toda boa distopia, tem um ritmo alucinante de mistério e suspense, e a elaboração de um subtexto precioso de resistência.
Em um futuro próximo, as fêmeas se tornam inférteis em função do excesso de radioatividade. Nesse contexto de crise (tanto de população quanto da produtividade de alimentos), um estado autoritário assume o poder dos Estados Unidos, sob o pretexto de estar combatendo os terroristas. Depois deste golpe, todas as atrocidades são validadas, e passam a ser a lei, o bastião da moral segundo o texto bíblico. Mais do que um plot, a ideia do romance de Atwood é quase uma profecia, cada vez mais concreta em tempos sombrios.
A má interpretação da Bíblia que fundamenta o estado de exceção de Gilead é um dos reflexos mais claros no espelho entre realidade próxima e distopia. Basta para isso verificar que a primeira tradução da Bíblia em língua portuguesa sairá neste ano, de 2017 (apesar de toda a carolice secular de Portugal). Os textos sagrados não são discutidos nem aqui nem no romance - são restritos a um grupo de estudiosos, que pregam a fé cega, a crença sem provas... assim, de onde estamos para a sociedade retratada pela canadense, será um abismo realmente? Ou apenas um pequeno passo nos separa de um mundo de barbarismos?
A escrita de Atwood é contundente, bem elaborada, com frases complexas que exigem, por vezes, mais de uma releitura. No entanto, como toda boa distopia, tem um ritmo alucinante de mistério e suspense, e a elaboração de um subtexto precioso de resistência.
Comentários
Postar um comentário