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Che Guevara para meninos e meninas (Nadia Fink e Pitu Saá)

A Coleção Antiprincesas e Anti-heróis da Editora Chirimbote é uma pequena revolução dentro de um dos mercados editoriais mais tabus que temos: o de livros voltados para crianças. Com belas ilustrações e um texto cativante, são contadas as histórias de ícones da América Latina, apresentando aos pequenos um tipo de valentia muito mais real e valorosa que a dos mocinhos de capa esvoaçante e sunga por cima da calça.

Assim como na obra voltada para Juana Azurduy, este é um livro que narra a existência de um guerreiro, o que traz uma série de questionamentos: até que ponto, afinal, suavizar a vida de quem teve de lutar, matar - e por vezes oprimir - em nome de um ideal maior? Acredito que talvez um recorte menor da biografia do Che poderia dar conta de apresentar sua história às crianças sem maiores danos. 

Por mais que seja uma grande fã do projeto, acredito que crianças precisam lidar com questionamentos e problematizações - senão, caímos no risco de reproduzir os mesmos modelos da literatura infantojuvenil politicamente correta. Faltou um pouco de desconstrução aqui. Além disso, a mudança de linguagem (agora com a incorporação de gêneros para todo e toda e qualquer adjetivo) deixa a leitura cansativa, mesmo para os pequenos. Na tentativa talvez de agradar a reivindicações de alguns setores, a coleção acaba comprometendo o seu objetivo principal - o de contar uma boa história.








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