"Gosto da Simone romancista, mas não da teórica" é uma frase que já escutei de diferentes pessoas, ainda que nenhuma delas tenha ofertado opiniões embasadas sobre O segundo sexo. Talvez, das mais de 800 páginas da grande obra de Beauvoir, a famosa frase — "Não se nasce mulher; torna-se mulher" — seja o fio divisor entre entusiastas e rancorosos. E ambos, na maior parte dos casos, a repete sem conhecer o vasto contexto que a contém.
Eu me encaixo no grupo dos que julgavam Simone sem conhecê-la — já sabia, antemão à leitura, que O segundo sexo era uma obra defasada. E foi com esse espírito de descrença que comecei a lê-la. O princípio do livro, que trabalha questões biológicas com um olhar dos anos 1950, só corrobora os preconceitos que trazemos hoje em relação à sua escrita.
E as críticas possíveis ao livro não param por aí: os exemplos burgueses e brancos para justificar posições ideológicas, a falta de contextualização no que se refere a distintas classes sociais, o uso da psicanálise para justificar conceitos frágeis, uma visão bastante complicada de gênero (ainda que Beauvoir tenha transitado tão levemente entre diferentes possibilidades de exercer sua sexualidade).
No entanto, mesmo com tantas ressalvas, continua sendo um livro poderoso. Me emocionei bastante durante a leitura, já que muitas das situações descritas correspondem às que minhas avós, minha mãe e eu passamos. São mais de 70 anos que nos separam, e ainda assim o objeto de crítica de Simone continua presente, pautando a educação de meninas educadas para serem frágeis.
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