Quando a pandemia chegou ao Brasil, já deixei A peste do Camus e outras obras distópicas empilhadas na cabeceira da minha cama – os livros sempre foram minha chave para entender o mundo, então nada mais natural do que procurar na literatura o que e quem explicasse o caos atual.
No entanto, boa parte da minha pilha só serviu para juntar pó. De certa forma, quis evitar um contato mais intenso com a realidade abominável que me cerca, em que a incompetência do estado só reforça a malignidade da doença. Somada a uma antipatia natural que sentia por Philip Roth (mesmo antes de o ter lido), pouco ou nada esperava de Nêmesis. E, talvez por isso, tenha sido uma das minhas melhores leituras do ano.
Antes de vivenciar uma pandemia, provavelmente a obra não funcionaria para mim; mas agora é um livro que cai bem como uma luva (ou uma máscara, o que preferir). Todas as reflexões sobre a culpa de ser um transmissor, a impotência e o medo geram uma identificação necessária com o que vivemos hoje. Além disso, o fato de o protagonista ser um homem banal, longe de heroísmos (e mesmo assim predisposto a tragédias) só reforça o poder abrangente do livro. Tudo isso é coroado com um final melancólico, mas que cria uma cena poderosa de beleza e saúde, como uma estátua atlética bailando em meio às ruínas.
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