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Mostrando postagens de julho, 2019

Mi obra maestra (filme de 2018)

Uma das melhores características do cinema argentino é, de fato, um traço marcadamente cultural: o humor ácido e incisivo. Por mais que nenhum estereótipo dê conta da singularidade humana, o fato é que reconhecemos muitos de nossos hermanos portenhos por uma refinada ironia. "Mi obra maestra" direciona esse olhar mordaz sobre o mercado contemporâneo da arte. Sem ser desoladamente crítico (como o longa sueco "The Square"), o filme aposta mais em uma visão sutilmente desconstrutora. Ainda que não abra mão de valores como a importância da amizade, a obra consegue um bom equilíbrio entre a narração delicada de uma vida e a ironia sobre o comércio de museus e galerias. Com atuações envolventes, cenas permeadas de bom humor e um final surpreendente, o filme vai além de um entretenimento justo. Mesmo que não aprofunde as reflexões sobre arte, consegue instigar o espectador com boas provocações.

Van Gogh: a vida (Steven Naifeh & Gregory White)

Se o elemento óbvio de uma boa biografia é a escolha de um personagem com vida rica em acontecimentos, a pesquisa empreendida por Steven Naifeh e Gregory White já nasceu bem-sucedida. Afinal, poucas figuras históricas correspondem tão bem ao paradigma do artista incompreendido e insano como Van Gogh o faz. A leitura que se propõe dos pensamentos e das motivações do artista holandês é bastante arriscada, tendendo quase a um viés psicanalítico. No entanto, não faltam elementos que deem fundamentação a essa escolha: não bastasse as mais de 1000 páginas da obra, ainda há um site apenas com a bibliografia utilizada na pesquisa, com traduções comentadas. Naifeh e White mostram como é possível lançar-se sobre temas bastante repisados e, ainda assim, descobrir novidades. O exemplo mais notável de análise inédita é a que os pesquisadores levam a cabo para entender o episódio da morte do pintor. Com o aval de médicos legistas e longa busca arquivística, os autores endossam a tese de que Van

LooKing for Richard (filme de 1996)

Por que continuar a ler Shakespeare hoje? O que um homem distante meio milênio de nós ainda teria a nos dizer? Trata-se de um autor supervalorizado? É um artista restrito aos meios acadêmicos, incapaz de despertar o interesse dos mais jovens?  Considerando as perguntas acima, não é de se estranhar que o título do filme que as aborda comece pela busca: LooKing . Essa mesma palavra, que remete à procura, também nos leva ao olhar: em uma atuação magistral, Al Pacino nos convida a ver, com uma mirada despida de preconceitos e da decoreba escolar, quem verdadeiramente foi Shakespeare. Composto de forma similar a um reality show - ou a um vasto making of de um filme/peça -, LooKing for Richard  é uma pluralidade de metalinguagens. A obra conta com entrevistas sobre o que os jovens sentem ao ler suas peças, falas de estudiosos renomados sobre o tema e detalhes da composição dos personagens pelos atores. Dono de uma profundidade impressionante, o longa é um dos mais indicados documentários

Brilho eterno de uma mente sem lembranças (filme de 2004)

"Brilho eterno de uma mente sem lembranças" é  um dos filmes mais interessantes da carreira de Jim Carrey - e talvez também da de Kate Winslet, que já participou de tantas obras de peso. A experiência de revê-lo quinze anos depois do lançamento destaca algumas inverossimilhanças (como a ideia de uma alta tecnologia desenvolvida em computadores de tubo), mas que não são o suficiente para invalidar sua proposta. Mesmo uma década e meia após sua produção, é um longa que continua a fazer sentido. Afinal, mais do que questões tecnológicas ou de biociência, o que está em jogo é um questionamento humano primordial: e se tivéssemos a oportunidade de recomeçar a vida do zero? Sem o peso de nossas memórias, qual seria a nossa identidade? Com trilha sonora envolvente, diálogos agudos e linda fotografia, a obra não desaponta nos quesitos técnicos. No que tange ao enredo ou à interpretação, igualmente: além de contar com uma estrutura não linear bastante instigante, o casal de protago