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Mostrando postagens de agosto, 2020

The Peregrine (J. A. Baker)

Na minha trajetória como leitora, consigo mapear claramente a influência de poucos livros, enquanto a maioria entremeia suas palavras à minha própria narrativa de vida de forma mais obscura, sem deixar traços evidentes que me permitam refazer esse caminho. Houve um livrinho de Tchekhov encontrado em um ferro-velho que me levou às Letras (e a cursar um ano de russo); os quadrinhos de Mafalda, que me desviaram do frio europeu para cursar o espanhol hermano; o "Cultura letrada", de Márcia Abreu, que estabeleceu um novo paradigma nas minhas conversas sobre literatura com alunos... e agora, na quarentena, houve o "The Peregrine". Ao buscar informações sobre o livro na internet, encontrei um vídeo intitulado "The book is so good that is impossible to read". A definição é certeira, ainda mais para quem dá de cara com a barreira da língua e de um vocabulário técnico-científico intransponível na tradução. Sem dúvida, é uma obra a que precisarei voltar com calma, de

Sul da fronteira, oeste do sol (Haruki Murakami)

  Murakami é um escritor que acompanho com certa regularidade desde 2013. No entanto, para além de minha mudança como leitora nesta meia década, talvez os últimos livros do autor com que entrei em contato não tenham sido uma boa escolha. O que me atraiu primeiramente no escritor foi seu estilo límpido, ainda quando carregado de elementos oníricos; mas não foi com a sensação de prazer diante de uma bela escrita que saí de minhas últimas leituras. Em "Sul da fronteira, oeste do sol", a figura patética e um tanto machista do personagem principal não tornou possível uma conexão maior com a trama. Há passagens que prendem a atenção do leitor, assim como frases de efeito que dão um charme à escrita. Contudo, o que realmente  me divertiu durante a leitura  (por motivos bastante pessoais)  foram as falas do protagonista criticando seu emprego de editor de livros didáticos. Fora isso, é uma narrativa fluida, mas da qual pouco retive.

Parafusos: mania, depressão, Michelangelo e eu (Ellen Forney)

 Talvez meu primeiro contato com uma abordagem mais séria do termo "bipolar" tenha sido ao assistir a um episódio da série Modern Love, com Anne Hathaway. Longe de ser uma produção televisiva com ares documentais, o episódio não precisava se aprofundar muito para mostrar o quanto esse distúrbio é muito mais complexo do que como é julgado à primeira vista. Experiência semelhante ocorreu durante a leitura de "Parafusos": o quadrinho, com características autobiográficas, não se propõe a ser um estudo científico sobre a bipolaridade. No entanto, é com base em leituras da psicologia e da história da arte que a autora se propõe uma questão instigante: a arte precisa estar ligada ao que é taxado como loucura? Ou, em outros termos: é possível ser criativo e medicado? Em alguns momentos, o quadrinho é realmente genial ao retratar, por meio de ilustrações com traços muito diferentes, a bipolaridade por meio de um recurso gráfico. Por mais que nem sempre a trama tenha me prend

O conto de areia (Jim Henson)

 Com um tom quase surrealista e uma narrativa frenética, "O conto de areia" não é um livro que se propõe a dar explicações. O fato de o protagonista passar toda a narrativa tão desorientado quanto o leitor gera um elemento de identificação - quando não de empatia. Ainda que não se trate de uma história muito profunda (ou repleta de camadas), a arte gráfica a transforma em um livro bastante instigante de acompanhar. O final é muito bem bolado, e consegue criar uma amarração que torna o todo coerente.

The Butterfly's Dream (filme de 2013)

O fato de registrar a biografia de dois poetas foi o atrativo que me levou até este filme turco. Ainda que de forma panorâmica, a obra evidencia alguns fatos históricos interessantes sobre a história da Turquia (bem como revela usos e costumes que nos são pouco familiares). Um dos recortes históricos mais curiosos da obra é mostrar como as notícias da Segunda Guerra chegaram até a confluência entre Europa e Ásia. Há também um enfoque maior na questão das minas de carvão da época, cuja narrativa encontra ressonâncias até hoje em empreendimentos similares do mundo. Por mais que o conjunto, como um todo, não seja ruim, o longa envereda por um tom melodramático forte ao final. É tanta desgraça sobreposta que fica difícil focar algum outro elemento da narrativa. Enfim, se não é um mau filme, tampouco contém elementos suficientemente trabalhados para torná-lo acima da média.

Gratidão (Oliver Sacks)

Os quatro artigos reunidos neste curto livro elaboram um panorama final da vida de Oliver Sacks. Neles, vemos desde a comemoração pelos 80 anos alcançados quanto a consciência da mortalidade que o atingiu pouco tempo depois. Ao ser diagnosticado com um câncer incurável, o neurologista anglo-americano faz uma breve retomada da sua vida e dos desejos que ainda tinha a cumprir antes de falecer. Ainda que a obra tenha menos de 100 páginas, conseguimos conhecer bastante dos fatos mais marcantes da vida de Sacks. Com a capacidade de síntese e objetividade científicas, o autor consegue focar o essencial durante sua jornada sobre a Terra.  Não é um livro com grande floreios literários ou coletânea de frases marcantes; é um retrato bem tirado de uma vida repleta de fatos e detalhes que importam – e que, por isso, mereciam o registro.