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Mostrando postagens de outubro, 2020

Lindinhas (filme de 2020)

"Lindinhas" foi mais uma obra cancelada na nossa cultura de juízes morais; um exemplo disso pode ser visto nas resenhas negativas e baixíssima nota que o filme obteve no Imdb (um ínfimo 3,0). O que provocou tanta polêmica é o fato de ser um filme incômodo, que coloca meninas de cerca de 11 e 12 anos em situações bastante erotizadas. No entanto, o objetivo da diretora é justamente este: questionar o quanto naturalizamos a sexualidade das crianças em nossa cultura, cercando-as de ícones e referências sensuais. Claro que o fato de as atrizes serem crianças e estarem expostas a falas obscenas e objetificação dos seus corpos pode ser questionada. Contudo, o que mais gravemente precisa ser discutido são as incômodas perguntas que o filme levanta. Para elas, o cancelamento não pode ser a resposta.

A maratona de Brittany (filme de 2019)

Clássica história de superação nos esportes, é um filme que tenta contar como uma mulher sedentária conseguiu se disciplinar para correr uma maratona, ao mesmo tempo que tenta (nem sempre com sucesso) não ser gordofóbico ou propor um padrão único de beleza. Filminho de sessão da tarde, vale o entretenimento para quem curte alguns dos temas envolvidos na produção.  

Rede de ódio (filme de 2020)

Este filme centra-se, desde o princípio, no vilão da história. Assim, é uma obra permeada de violência em distintos níveis e com graus variados de requintes sádicos. Contudo, dada a premissa, vale ressaltar que o longa oferece um olhar bastante interessante sobre o cenário que aborda, sem relativizar a maldade dos responsáveis por manipular algoritmos e dados virtuais. Ainda que o protagonista se revele mau-caráter desde o princípio, o fato de ser interpretado por um ator jovem pode ser lido como uma alegoria da nova geração que se constrói. Se já sabemos que somos controlados o tempo todo pelas redes (e o aceitamos), como as próximas gerações lidarão com essa banalidade do mal? Até que ponto nosso pacto de convivência será flexibilizado em nome do poder das redes? Além dos questionamentos que provoca, o filme também vale pela excelente atuação do ator principal. Em uma das cenas, a câmera foca seu rosto e oferta-o para a interpretação do espectador; me lembrou outros filmes que utiliz

El sueño del celta (Mario Vargas Llosa)

Essa é minha segunda tentativa com a literatura de Vargas Llosa, que já me causa uma antipatia natural por seu posicionamento político conservador e suas falas carregadas de preconceito e falta de bom senso. Novamente (assim como em "Os chefes"), me deparei com uma obra que pouco me faz relevar o mau caráter de que o escreve. "El sueño del celta" é um resgate histórico de um personagem real – e, assim, dificilmente não seria enviesado. É tamanha a quantidade de adjetivos que Llosa usa para construir o seu protagonista que chega a parecer a obra de um autor principiante. Além disso, basta um pouco de pesquisa para ver que a narrativa deixa muitos fatos imprescindíveis de lado, como a pirataria genética do látex empreendida pela Inglaterra, o conflito pelos seringais na Amazônia, os milhares de mortos na construção da Madeira Mamoré. Não interessa pela prosa e muito menos pelo recorte histórico. Pior livro que li este ano e uma das minhas últimas tentativas de entende

Baby animals (Maja Säfstrom)

Livro recheado de ilustrações amorosas e fatos curiosos sobre a vida dos animaizinhos. Minha única restrição a essa leitura encantadora é a falta de fontes sobre os dados referenciados ao longo da obra.

Vivir para contarla (Gabriel García Márquez)

Há certo tempo não entrava em contato com a escrita de Gabo – pausa que sempre me causa o receio de descobrir que meus escritores preferidos já não me dizem nada. No entanto, que delícia foi me aventurar pela autobiografia do autor do meu romance favorito! Uma das surpresas boas da leitura foi resgatar algumas origens familiares para o enredo e personagens de "Cem anos de solidão", além das de outros escritos, como "O amor nos tempos do cólera". Outra das descobertas foi entrar em contato com o lado humorístico do autor ao narrar a própria vida – um tom que lembra o de um bom contador de causo, que sabe como prender a atenção de seu ouvinte. Por fim, outra das características apaixonantes desse livro é ver o autor falar sobre sua relação com a leitura e com a escrita e como seu caminho, desde sempre, foi traçado rumo ao mundo das palavras.

Daqui pra baixo (Jason Reynolds)

Foram tantas as resenhas positivas com que me deparei em relação a esse livro que acabei frustrando minhas expectativas durante a experiência de leitura. Não se trata de uma obra ineficiente, mas é muito mais um livro que indicaria aos meus alunos adolescentes como um paradidático do que uma obra de alta desfrutação estética. A escolha pela composição em formato de poema parece dialogar mais com a tradição do rap do que com a estrutura do texto em si. Assim, não se trata de uma história narrada com muita precisão e intensidade, mas sim uma fala transposta em poema. Um tanto previsível, o livro ainda assim traz um desfecho que consegue ser surpreendente. Assim, é uma boa forma de começar a envolver os adolescentes com temáticas que lhes interessam por meio da literatura.  

Balada da estrela e outros poemas (Gabriela Mistral)

Por ter atuado em causas muito afins às de Cecília Meireles, tinha a expectativa de que essa antologia de poemas de Mistral, voltada ao público infantojuvenil, tivesse um tom semelhante ao do incrível "Ou isto ou aquilo". No entanto, o fato é que a pena da poeta chilena pesa mais na página, criando uma literatura que é ou datada ou inacessível para as crianças por motivos diversos. Ainda que a edição seja caprichada, com ilustrações belíssimas, e que a tradução tente criar uma ponte entre o pequeno leitor e Mistral, o livro é bastante difícil. O vocabulário é rebuscado e há um tom melancólico (além da culpa cristã) permeando toda a obra. Se é capaz de encantar os pais pelo refinamento da edição, não sei se tem a mesma sorte com as crianças a que se destina.

O ano da leitura mágica (Nina Sankovitch)

A premissa da obra pode parecer bastante superficial à primeira vista: a autora se propôs a ler um livro por dia durante um ano e registrar os resultados dessa empreitada. Contudo, o que motiva Nina Sankovitch a realizar esse trabalho é uma angústia comum a todos nós, leitores: tentar entender a vida por meio dos livros. Na busca de superar o luto pela perda da irmã, a autora resgata um dos laços que as unia mais fortemente: o prazer pela leitura. Assim, a cada obra que lê, a escritora encontra um meio de repensar os caminhos que a levaram até aquele livro, bem como revê as memórias que tem da irmã sob outra perspectiva. Apesar de ser um livro muito fácil de ler, o poder das reflexões levadas a cabo pela autora não deve ser menosprezado. Mais que um diário de leituras, é um registro de como as histórias de vida se interpenetram pelas palavras.

The picture of Dorian Gray (Oscar Wilde)

Meu primeiro contato com Oscar Wilde foi por meio de um livro adaptado para estudantes da língua inglesa. Na época, achei "O fantasma de Canterville" uma história bem ingênua, que não me fisgou como leitora. Agora, ao entrar em contato com o grande clássico do escritor irlandês, vi que essa impressão não foi gerada por conta de uma adaptação simplista; ainda que reconheça o valor da obra, "The picture of Dorian Gray" tampouco me surpreendeu. Há elementos de valor no livro, sem dúvida. O início, com as frases marcantes de Lord Henry, é especialmente cativante. No entanto, aos poucos, as máximas desse personagem e o próprio destino de Dorian Gray se tornam um tanto repetitivos, fáceis de deduzir sem muito esforço de inferência. Talvez minha percepção seja bastante deturpada por já conhecer as adaptações desse livro ao cinema. No geral, por mais que não tenha sido uma leitura apaixonante, foi um trabalho recompensador me deparar com as alfinetadas de Oscar Wilde à soci