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O banheiro do Papa (filme de 2007)

Há algum tempo, viralizou nas redes a foto de um avô que fez 12 hambúrgueres para seus 6 netos, mas apenas 1 deles compareceu à janta. Com a forte crença de que a casa ficaria cheia, o velhinho esperou, diante dos pratos cheios, por muito tempo. Só ao final decidiu fazer a sua refeição decepcionado, com uma única parente a lhe fazer companhia.

Se esta situação já é de cortar o coração, por expor a fragilidade emocional de um senhor idoso, imagine-a ampliada. Pense em uma cidade inteira, a esperar muito mais que 6 netos, e a sair dessa experiência quebrada economicamente, além de totalmente desiludida após a realização de um evento religioso.

Quando o Papa João Paulo II visitou a minúscula cidade de Melo, no Uruguai, em 1988, houve um grande rebuliço entre seus habitantes. Na esperança de ganhar uns trocados, muitos deles investiram o que não tinham para montar barraquinhas de comida e fabricar enfeites religiosos.

O filme nos traz este contexto e põe como personagem principal Beto, que resolve construir um banheiro para os peregrinos. No entanto, o que ocorre ao final é que a visita do Papa, em termos econômicos, é um fracasso. Quilos e quilos de comida são jogados fora, e os personagens precisam se virar com os endividamentos que fizeram. 

Um dado que faz pensar, ao final do filme, com vários personagens pobres e religiosos que saem completamente prejudicados do evento, é que a obra talvez se chame "O banheiro do Papa" e não o "O banheiro de Beto" pelo fato de a figura religiosa ter levado apenas merda para a cidade.


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