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Eva no duerme (filme de 2015)

A história do corpo embalsamado de Evita é impressionante: como Branca de Neve, a proposta é que a populista argentina ficasse exposta em um mausoléu, que nunca chegou a ser construído (em função da ditadura militar). Quando os milicos assumiram o poder, seu corpo foi vigiado por um coronel e, depois, por um general — inclusive com a acusação de que teria sido violada por um deles.

Evita morta vai para o Vaticano; é exigida como troca em um um sequestro; é desenterrada e vista como um milagre pelos coveiros abismados; é enfeite na casa de Perón; é boneca nas mãos de Isabela Perón, que faz compras de roupas e renova seu figurino; é assombração, impedindo o general que a tinha anteriormente sob guarda de ocupar a mesma residência que ela; e, por fim, é enterrada no cemitério La Recoleta.

Uma narrativa tão potente tinha de tudo para render um filme bom — mas não é necessariamente o caso. Há uma tentativa forçada de incluir o astro Gael García Bernal em um papel bastante inverossímil, só para fazer uma ponta e garantir seus créditos na obra. Além disso, há um tom de teatro do absurdo que gera cenas mal explicadas e pouco aproveita a potencialidade do mote com que se trabalha — poderoso até a morte.



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